Sunday, June 3, 2007

poema


As coisas mais simples, ouço-as no intervalo
do vento, quando um simples bater de chuva nos
vidros rompe o silêncio da noite, e o seu ritmo
se sobrepõe ao das palavras. Por vezes, é uma
voz cansada, que repete incansavelmente
o que a noite ensina a quem a vive; de outras
vezes, corre, apressada, atropelando sentidos
e frases como se quisesse chegar ao fim, mais
depressa do que a madrugada. São coisas simples
como a areia que se apanha, e escorre por
entre os dedos enquanto os olhos procuram
uma linha nítida no horizonte; ou são as
coisas que subitamente lembramos, quando
o sol emerge num breve rasgão de nuvem.
Estas são as coisas que passam, quando o vento
fica; e são elas que tentamos lembrar, como
se as tivessemos ouvido, e o ruído da chuva nos
vidros não tivesse apagado a sua voz.
Nuno Júdice, in As Coisas Mais Simples, 2006

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